Reforma Tributária e substituição tributária: ela vai acabar?

Compartilhar conteúdo

A Reforma Tributária, aprovada em 2023 por meio da Emenda Constitucional nº 132, promove uma das maiores mudanças no sistema tributário brasileiro nas últimas décadas. Entre os diversos regimes e mecanismos que serão revistos ou extintos, um dos mais discutidos é a substituição tributária (ST).

Conhecida por sua complexidade e por gerar inúmeros conflitos entre contribuintes e o fisco, a ST sempre foi vista como uma solução para facilitar a arrecadação — mas, ao longo dos anos, passou a ser alvo de críticas por parte de empresas, contadores e especialistas em tributação.

Com a criação dos novos tributos IBS (Imposto sobre Bens e Serviços) e CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços), o modelo de substituição tributária perde espaço. Mas será que ele vai realmente acabar? E o que muda para as empresas que operam nesse regime?

O que é substituição tributária (ST) e como funciona hoje

A substituição tributária é um mecanismo pelo qual o imposto devido em uma cadeia de circulação de mercadorias é recolhido antecipadamente por um dos contribuintes, normalmente no início do processo, como o fabricante ou o importador. Essa prática visa simplificar a arrecadação e evitar a sonegação no varejo.

Em vez de o imposto ser recolhido por cada elo da cadeia produtiva (fabricante, distribuidor, lojista), a arrecadação é concentrada em um único ponto, que recolhe o tributo também pelos demais.

A principal aplicação da ST ocorre no âmbito do ICMS, especialmente nos regimes estaduais. Porém, existem modalidades similares no IPI e em PIS/Cofins, no chamado regime monofásico.

Papel do contribuinte substituto e substituído

No regime de ST, os papéis são bem definidos:

  • Contribuinte substituto: é o responsável por recolher o imposto antecipadamente em nome dos demais. Geralmente é o fabricante, importador ou primeiro elo da cadeia de circulação.
  • Contribuinte substituído: é quem recebe a mercadoria já com o imposto recolhido. Ele não faz novo pagamento, mas precisa registrar e declarar corretamente o valor embutido.

A responsabilidade tributária, portanto, é deslocada do varejo para o início da cadeia. Embora isso pareça prático, na realidade, cria desafios operacionais e financeiros que impactam diretamente o dia a dia das empresas.

Tributos e mercadorias abrangidos pela ST

A substituição tributária é mais comum em operações com:

  • Combustíveis
  • Bebidas alcoólicas
  • Cigarros e derivados do fumo
  • Medicamentos
  • Produtos de higiene pessoal e cosméticos
  • Pneus e autopeças
  • Alimentos e bebidas industrializadas

Cada estado tem liberdade para definir os produtos sujeitos à ST, o que gera dificuldades para empresas que operam em diferentes unidades da federação, já que as regras variam amplamente.

Além do ICMS-ST, há o regime monofásico de PIS/Cofins, em que a tributação ocorre de forma concentrada na indústria ou importação, sendo comum nos setores de combustíveis, bebidas, cosméticos e farmacêuticos.

Principais críticas e dificuldades no modelo atual

Embora tenha sido criada com a intenção de simplificar, a substituição tributária é considerada hoje um dos regimes mais complexos e litigiosos do sistema tributário brasileiro. Entre os principais problemas estão:

  • Base de cálculo presumida: o valor do imposto é calculado com base em uma margem estimada, o que gera injustiças quando o preço real de venda é menor;
  • Dificuldade de ressarcimento: quando há pagamento a maior, recuperar esse valor é burocrático e demorado;
  • Multiplicidade de regras estaduais: a falta de padronização aumenta os erros operacionais e exige conhecimento profundo da legislação local;
  • Impacto no fluxo de caixa: o recolhimento antecipado pesa especialmente para empresas com margens menores ou capital de giro limitado;
  • Judicialização frequente: divergências sobre responsabilidade pelo recolhimento ou margens aplicadas geram contencioso constante.

Esses pontos são justamente os que a Reforma Tributária pretende eliminar ou corrigir, ao propor um novo modelo tributário mais simples, neutro e transparente.

Entenda tudo sobre a Substituição Tributária em: “Substituição tributária: o que sua empresa precisa saber para emitir corretamente”. 

O que a Reforma Tributária propõe sobre a ST

A substituição tributária, como é aplicada atualmente no ICMS e em alguns tributos federais, não será compatível com a estrutura dos novos tributos criados pela Reforma Tributária, o IBS (Imposto sobre Bens e Serviços) e a CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços).

A proposta da Reforma é promover simplicidade, neutralidade e transparência, e a ST, por sua própria natureza, é um entrave a esses princípios. Isso leva à previsão de sua extinção progressiva, com exceções pontuais.

Leia também: “O que é código de situação tributária (CST) e como preencher corretamente”. 

Mudanças com a criação do IBS e da CBS

A CBS (de competência federal) e o IBS (de competência estadual e municipal) substituirão tributos atuais como PIS, Cofins, ICMS e ISS, que hoje utilizam o regime de substituição tributária em diversos setores.

Com esses novos tributos, o sistema se torna:

  • Não cumulativo na prática,  o crédito financeiro será amplo, automático e integral;
  • Tributado no destino, ou seja, a arrecadação será vinculada ao local do consumo;
  • Baseado em valores reais, sem presunções ou margens arbitrárias.

Dessa forma, a lógica da ST que exige antecipação do imposto com base em margens estimadas, perde sentido técnico e jurídico.

Tudo sobre os novos impostos em: “Reforma tributária: CBS, IBS, Imposto Seletivo (IS) e novas alíquotas”.

Extinção progressiva da ST no novo sistema

A Reforma prevê uma transição gradual entre os modelos, o atual e o futuro. A substituição tributária será extinta progressivamente até 2033, conforme os seguintes marcos:

  1. 2026–2028: fase de transição com convivência entre tributos antigos (como ICMS e PIS/Cofins) e novos (CBS e IBS);
  2. 2029–2032: aumento gradual das alíquotas da CBS/IBS e redução dos tributos antigos;
  3. A partir de 2033: vigência plena do novo sistema, com extinção de ICMS-ST e demais regimes de substituição.

Durante esse período, será essencial que as empresas revisem seus processos fiscais e operacionais para se adaptar à nova realidade.

Essa extinção progressiva da ST está alinhada aos objetivos centrais da Reforma:

  • Simplificação do sistema;
  • Redução de litigiosidade;
  • Maior previsibilidade para empresas.

Setor de combustíveis e regime específico

Embora a substituição tributária como regra geral vá desaparecer, o setor de combustíveis continuará com um regime diferenciado,  mas com outra estrutura jurídica.

Nesse caso, será mantido um regime monofásico de tributação, com recolhimento concentrado no primeiro elo da cadeia (fabricante ou importador), mas:

  • Com alíquotas fixadas por lei nacional;
  • Sob gestão compartilhada entre União, estados e municípios;
  • Inserido dentro da lógica dos novos tributos (IBS e CBS), e não mais como regime “ST” clássico.

Essa exceção tem fundamentos técnicos e operacionais, já que combustíveis possuem alta rotatividade, elasticidade de preço e desafios de fiscalização.

Banner ilustrativo do sistema com link para cadastrar e testar o sistema gratuitamente.

Impactos para empresas que hoje recolhem via ST

A extinção progressiva da Substituição Tributária (ST) representa uma mudança estrutural e operacional para empresas de diversos setores, especialmente aquelas que atuam com comércio varejista, distribuição, fabricação ou importação de mercadorias sujeitas à ST, como medicamentos, combustíveis, bebidas e autopeças.

Embora o novo modelo traga ganhos de simplicidade e previsibilidade, a transição exigirá ajustes significativos nas rotinas fiscais, na gestão de fluxo de caixa e nos sistemas de apuração.

Ajustes na apuração e escrituração fiscal

No modelo atual com ST, muitas empresas não apuram o ICMS nas suas saídas, pois o imposto já foi recolhido de forma antecipada pelo substituto tributário. Com a implantação do IBS e da CBS, isso muda:

  • Cada empresa passará a apurar seus próprios tributos sobre o valor efetivo das vendas;
  • O modelo será de crédito financeiro integral, ou seja, será possível descontar o imposto pago nas compras (sem travas como “essencialidade”);
  • A escrituração fiscal precisará refletir corretamente os débitos e créditos, exigindo atualização dos sistemas e processos internos.

As empresas devem preparar seus ERPs e equipes fiscais para uma nova lógica de apuração não cumulativa, mais parecida com o modelo do IVA utilizado em países da OCDE.

Repercussões sobre o fluxo de caixa e recolhimento

No regime de ST, o imposto é pago antecipadamente, antes mesmo da venda ao consumidor final. Isso costuma representar um peso no caixa, especialmente para empresas com margens reduzidas ou que operam com grandes volumes de estoque.

Com o fim da ST:

  • O tributo será recolhido somente após a venda, com base no valor real da operação;
  • Haverá maior equilíbrio no fluxo de caixa, já que o pagamento será feito de forma proporcional à receita;
  • Empresas poderão criar estratégias mais eficientes de precificação, sem precisar embutir o custo da antecipação tributária.

Entretanto, essa mudança exigirá disciplina na escrituração fiscal e atualização nos prazos de pagamento, para evitar multas por inadimplência.

Integração com os novos sistemas de arrecadação digital

A Reforma também prevê a criação de uma plataforma nacional digital de apuração e recolhimento do IBS e da CBS, com objetivo de unificar e simplificar o cumprimento das obrigações acessórias.

As principais características desse novo sistema:

  • Interface única para apuração e pagamento dos tributos sobre o consumo;
  • Compartilhamento automático das receitas entre União, estados e municípios, sem necessidade de cálculos por parte das empresas;
  • Possibilidade de integração direta com os ERPs e sistemas de emissão de NF-e.

Empresas que hoje operam com múltiplos cadastros estaduais e regras diferentes por UF terão um ambiente mais padronizado e centralizado, reduzindo a carga administrativa.

Leia também: “A Reforma Tributária e o impacto na emissão de NF-e”. 

Perguntas frequentes sobre a ST na Reforma Tributária

1. A substituição tributária será totalmente extinta?

Sim, com exceções pontuais. A substituição tributária será extinta progressivamente até 2033, com a implementação total dos novos tributos IBS (estadual e municipal) e CBS (federal).

A lógica da Reforma é incompatível com o modelo de recolhimento antecipado da ST, pois:

  • O IBS e a CBS operam com não cumulatividade plena e crédito financeiro automático;
  • A base de cálculo será o valor real da operação, eliminando a necessidade de margens presumidas.

Exceção: O setor de combustíveis poderá manter um regime monofásico específico, mas fora do modelo clássico de ST.

2. Como ficam os produtos que hoje estão sob ST?

Produtos atualmente enquadrados na substituição tributária (como medicamentos, cosméticos, bebidas, autopeças, etc.) passarão a ser tributados normalmente pelo novo modelo:

  • A tributação será feita por cada elo da cadeia, com crédito integral do imposto pago na etapa anterior;
  • A empresa deixará de reter ou recolher antecipadamente o imposto da cadeia seguinte;
  • O fluxo de apuração será simplificado e padronizado nacionalmente, com cobrança no destino e destaque do IBS/CBS na nota fiscal.

Para a empresa, isso significa maior controle sobre a própria carga tributária e redução de litígios sobre margens de valor agregado.

3. Haverá devolução de créditos de ICMS-ST após a mudança?

A depender da regulamentação complementar, sim. Durante o período de transição, poderá haver regras específicas de compensação ou ressarcimento de créditos acumulados de ICMS-ST.

Entretanto, como o ICMS-ST foi calculado com base em margens presumidas, o direito à restituição dependerá de:

  • Comprovação de que o valor recolhido foi superior ao efetivamente devido;
  • Processos de revisão fiscal e escrituração adequada;
  • Normas estaduais e ajustes entre os fiscos, conforme acordos de transição e atuação do Comitê Gestor do IBS.

Por isso, é fundamental que as empresas organizem seus saldos, escrituração e documentos fiscais para eventual aproveitamento.

4. O que muda para contribuintes substitutos?

Empresas que hoje atuam como substitutos tributários, ou seja, que recolhem o ICMS-ST antecipadamente em nome da cadeia, deixarão de ter essa obrigação à medida que o novo sistema for implantado.

As mudanças incluem:

  • Fim da responsabilidade solidária pelo imposto da cadeia;
  • Apuração do imposto será feita com base na própria receita, como qualquer contribuinte do IBS/CBS;
  • Ajustes nos sistemas fiscais e eliminação de regras específicas por produto/UF.

Em termos práticos, deixar de ser substituto significa redução da complexidade operacional, menor risco de autuações e maior previsibilidade tributária.

Todas as respostas sobre a Reforma Tributária em: “Reforma Tributária: perguntas e respostas”.

Conclusão: fim gradual da ST e transição para um modelo mais simples e unificado

A extinção progressiva da substituição tributária (ST) representa um dos marcos mais significativos da Reforma Tributária aprovada em 2023. Após décadas de uso como mecanismo de antecipação e concentração de arrecadação, a ST perde sua função no novo cenário, onde tributos como o IBS e a CBS operam com não cumulatividade plena, tributação no destino e crédito financeiro integral.

O fim da ST será gradual, respeitando o cronograma de transição que vai até 2033. Nesse período, as empresas precisarão se adaptar às novas formas de apuração, atualizar seus sistemas e se preparar para um ambiente fiscal mais automatizado, transparente e padronizado.

A única exceção significativa será o setor de combustíveis, que poderá operar em regime monofásico, mas fora da lógica tradicional da substituição tributária.

Apesar dos desafios operacionais no curto prazo, a mudança tende a trazer ganhos de eficiência, redução de litigiosidade e simplificação tributária para todos os setores da economia. O novo modelo elimina distorções, melhora o fluxo de caixa e contribui para um ambiente de negócios mais competitivo e previsível.

Empresas que hoje operam sob ST devem antecipar ajustes e planejar a transição, acompanhando de perto os desdobramentos legais, regulamentações complementares e sistemas digitais em desenvolvimento.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Conteúdos relacionados

Banner de uma empresária satisfeita com o sistema ClickNotas, com frases e propaganda para o sistema.

Índice

Índice